31 dezembro 2015

Resoluções 2016

Aconteceste-me, 2015.
Imensamente desejado,
Atravessaste o meu caminho
E segues, agora, a tua vida.
Deixas-me as memórias
Da luta dos dias,
Do longo e doloroso caminho pisado,
Como que adolescente,
À beira-risco das descobertas.

Empurras-me para um estado adulto
Doutro longo caminho
Que vejo abrir frente a cada passo.
Os dias deixarão a luta
E a grande das descobertas
Será de ser,
Será de paz,
Indolor.

Imensamente desejado,
2016.

Bom dia

Saí à rua no último dia do ano
E um perfeito estranho
Sorri
Bom dia, diz
Sorrio
Bom dia, digo.

Estranhamente perfeito,
Com tão pequena atenção,
Poder este homem causar
Tão grande satisfação.

Hoje,
O último dia do ano,
Nasceu a cumprimentar.

29 dezembro 2015

Agitação marítima

É tão distante este acompanhar dos dias
Disfarçado de mar de gente presente...
Mas, assim que a gente rebenta na praia,
Engole-a a areia,
À gente e aos seus tesouros.

Ficam os grãos molhados de atenções
Aguardando as novas vagas que virão.

Nem se percebe
Que é solidão.

28 dezembro 2015

Quiçá

Vive-se.
Ou não.
Vai-se lá saber...
O respirar
Não é prova
De coisa nenhuma!

Ternura

Existes.
Olho-te com olhos grandes
Maiores do que o mundo
Para neles caberes por inteiro.

E, ainda assim,
Ficam-te os pés de fora!

27 dezembro 2015

O bem saber do ser

Sou,
Mas não o sei.
Como sabe tão bem ser?
Eu não sei.
Absorvo lentamente
O seu saber
Assim passado,
Sendo
E conversado.
Até eu perceber
O saber que sou.
Um dia virá
A tão bem me saber.

12 outubro 2015

Corrida

Passada pesada, sonora e ritmada,
Bate na terra com toda a ira
De quem devolve os desgostos de uma vida inteira.

Até que a dor do corpo faz, finalmente, calar a dor da alma
Lançando-o, esgotado, por sobre a relva.

Dez quilómetros numa hora.
É tudo o que agora importa.

Curandeiro

A perda acontece.
Pouco importam os receios do antes,
As dores do durante
Ou as cicatrizes do após.
Acontece.

Mas o nascer do sol também,
A sarar.

Ofertório

Dou a poesia,
Com mãos largas e desprendidas.
Valerá o que o apreço sentido deixar...

De mim,
Dou o que tenho.

Voo

Liberta o medo, abre-lhe a gaiola
E deixa-o sair do peito,
Tornar-se uno com o todo universal.

Verás que a existência continua, ainda assim,
Mais leve, porém.



Recital

Se fechar os olhos, sinto o cheiro quente das velas
Cera derretida pingando por sobre o soalho de madeira
O tom cantado das escrituras ecoando longínquo
Vindo do passado, do velho livro aberto no púlpito...
E os versos vão-se propagando numa voz límpida, grave, bonita
Entrando profundamente nas minhas memórias do sagrado...
Transportam nas suas rimas o conforto da crença
Numa mão invisível que nos ampara na queda
E nos envolve em pertença.

Se fechar os olhos, e fecho, ouço a poesia religiosamente.

Eis quando o espírito se apazigua soltando uma lágrima,
Vertendo alívio.

20 agosto 2015

Lógica

É uma saga interminável:
Forço a tua existência, teimosamente.

E o axioma é:
Eu existo, logo, tu existes!

Ainda que ninguém o saiba...

17 agosto 2015

Mutação

Desculpa exigir tanto de ti...

Mil perdões,
Desculpa, desculpa, desculpa...

Querer-te igual a ontem
Num hoje tão difícil, tão impossível,
Tão fora do teu controlo...

Só quero dar-te um incentivo
A acreditares no dia,
Manteres a tua força mental
Só porque preciso de ti...

E como te esforças por mim!

Como ninguém...

Desculpa só ver à distância,
Desculpa exigir tanto... por ti!

02 julho 2015

Desespero

Vacilo...
Que direcção tomar?
A da luta pela vida
Ou a da luta pela morte?

Parecem iguais!

Os títulos

Sai mais um papel
Há que assinar a realidade.

Vejo-te alerta.

Percebes
Que te tratam da saúde!

01 julho 2015

O que é isto?

Se não é amor, o que é?
Perdi-me.

De repente fiquei sozinha,
A porta destrancada ao luto.

Só agora, sim, só agora,
E contra todas as evidências,
Só agora.

A tua ausência transmutou-se.

Poderia ter ficado na eternidade ilusória,
Na dor morna, suportável, constituinte.

Perdi-me do amor filial
E encontrei a tua morte, mãe.

Mas, afinal, o que pode ser?

29 junho 2015

Acampamento

Acampamos as duas,
Tu lá dentro
Eu cá fora...

É o possível.

VERMELHO?!

É Natal.
O coração sangra
Com a mesma cor em mesa posta.
Agressiva.
Violento fingimento de normalidade.
Como se fosse possível
Ser Natal, haaah!

Manas

Vejo-as
E é o quanto me basta.

Onde a pinça, a cera?
Ai essa cor no cabelo!

Uma alegria de dia-a-dia procurada
Na leveza de preciosas banalidades!
A amorosa oferenda da abstração necessitada...

Somos e estamos como sempre fomos e estivémos.

Que laço tão apertado!
Traz a eternidade nas pontas.

28 junho 2015

O estendal

Urge ensinar-te o estender da roupa,
Fazer-te uma mulher com brio.
O tempo escasseia
E não ficará ninguém que se interesse.
Recomeça, vá.
Não te irrites.
É a minha distorcida forma de amar,
De deixar algo de mim em ti.

Leva-me daqui.
As pernas contrariam-me.
Não obedecem.
Como tu.

Relógio prateado

Pesado e largo no seu abraço à magreza forçada,
Mas tão absurdamente necessário!
Oferece ao pulso dorido o controlo do dia,
O acalmar de ansiedades.
O tempo tiquetaqueando lentamente...
Dolorosamente.
Absolutamente necessário
Este compassar  de uma espera desalentada,
Do sentido perdido...
Com o seu ponteiro amigo
Fixará a hora certa
Em que o tempo se imobiliza.

24 maio 2015

Dia Santo

O Sol domingueiro mal despontou
Urge varrer portadas
Queimar restolhos
Lavar campas
E garagens

Preparar a dignidade do dia Santo
Nos templos da permanência

26 abril 2015

Elos

O tempo deixou de te faltar,
mãe.
O comprimido sobra.
Não há já dor nessa casa...
Não há dor no teu corpo vencido
E enterrado em lugar
Dito bonito,
Digno.

O tempo passou a faltar-me a mim,
mãe.
E não há comprimido.
Apenas esta dor escondida nesta mente
Que ataca amiúde, à traição,
Nauseabunda.

Rendo-me?

Não é de mim.

Até um dia, 
Pois o tempo deixará também de me faltar,
mãe.

21 março 2015

O tempo que falta

O comprimido.
Dá-me...

Já deste? Não me lembro,
A dor diz-me que não
Tu dizes-me que sim...
Dá-me...

Não me deixes assim,
Não importa o tempo que falta
Essa hora distante
De segundos martelados pelo corpo...
Faz-me falta, sem falta me fazer
Que a dor está cá e não há magia,
Apenas esperança num alívio
Que não acontece.
Ninguém percebe,
Ninguém sente o meu corpo falido,
A ansiedade da espera.
As longas noites em desespero
Ou os longos dias sem sentido,
Numa existência sabida perdida
Mantida sofrida em momentos que existem,
Lentos,
Demorando-se centímetro a centímetro,
Dominando um peso insuportável.

E urge o tempo que falta.
O comprimido.
Dá-me.

A mente vencida pelo cansaço
De um corpo desobediente.

12 março 2015

As tias

As tias são como um prolongamento de mãe.
Conhecem-na. Conhecem-me. Entendem.
Desde o quase nada que fomos no nascer até ao quase qualquer coisa que somos no agora.
E amam, dão conselho em mil cautelas, para não doer.
Acolchoam momentos difíceis como alegram momentos felizes.
Estão por aí, fazem saber.
Sempre que é preciso.
Assim como uma mãe, que lhe corre nas veias, também.

É um conforto ser-vos sobrinha.

Abraço apertado e amado.

23 janeiro 2015

Soco

De vez em quando, a realidade encontra-me.
Quase sempre, estou distraída a viver banalidades:
Um raio de sol força caminho por entre as nuvens
E a ponte madrugadora fica mais bonita sobre o rio.

O peito contrai-se de dor, as perdas socam com força.
A lágrima cai.

O instante passa e a ponte também.

14 janeiro 2015

Caverna

Caixas e paletes
Frascos, tampas e mais cartão
Ó senhores, faz lá o frete
E manda o que deves:
Tirar o lixo do chão!

01 janeiro 2015

Adeus 2014

Sim é verdade
O céu pode cair aos bocados
E não
Não é feito de algodão
Antes de chumbo negro e pesado
A enlutar o coração

Ano do demónio
Vai-te!