30 junho 2017

Sem esposa

Pequena Micaela, amor que brilhas nos olhos de teu pai,
Faltou-te a mãe ao nascer mas este homem abraçou a tua vida...
Transborda de ti a sua alma e lança em teu redor sementes de futuro.
Filha de teu pai, sente a sua mão que te ampara o dia em alegria.
Rapariga, a fortuna quis-te bem depois do mal, sempre a esperança
Brota quando nasce o Sol e espalha pelo céu infinitas possibilidades.

29 junho 2017

Namorando

Homem solteiro, bonito,
Passeando sua filha pequena
É mel que adoça corações...
E, não se apegando, vai dançando
Com uma, com outra,
Pelos salões.

28 junho 2017

O lar de Micaela

A Vila Pinto amolece o coração
E adopta no seu colo esta doce criança.

27 junho 2017

Harshal na Vila Pinto

Assim se chega à Vila dos acontecimentos
Onde esta novela se enovela, é este o lugar:
Um indiano viúvo e sua filha aqui estão
Têm largo dote e vêm-se instalar
No maior prédio, com loja no rés-do-chão,
Por cima habitando um exótico andar.
Tudo tem direito a ruidosa inauguração,
A vizinhança vem toda ela a espreitar
E sai com um lindo presente na mão.
Assim começa o novo negócio a despontar,
A vida quer arrancar com ventos de feição.
Na Vila Pinto, se entrelaçam sentimentos...

26 junho 2017

Caminhos de luz

A alegria torna-se uma possibilidade.
A vida brilha sob o sol deste inverno,
Tudo será bem melhor nesta cidade!
Sem saber porquê, tudo em si é terno,
Até a dor se transformou num amor...
Harshal sente-se homem abençoado
Do fundo do desespero resgatado.

25 junho 2017

Lisboa

Eis Lisboa, a magnífica!
É fresco o ar que o inebria.
O olhar humedece
Como se num regresso ansiado...
Eis Lisboa, o seu novo lar,
E o coração já transformado!

Praça Duque de Saldanha e Avenida da República, 1940- in blogue 'Lisboa de Antigamente'


24 junho 2017

O dote

Esse terrível garrote
Que torna insano o nascimento
Se menina fôr,
Mas abençoado o casamento
Se menino aparecer,
Esse maldito dote
Servirá um renascer!
Graças ao dinheiro de Gora
Um futuro se acautela
E assim se vão embora
Harshal e Micaela!

23 junho 2017

Micaela será

Harshal chora grossas lágrimas
Desespero, medo, uma grande ansiedade
Larga a vida que conhece nesta cidade
Parte com uma filha mal nascida
De um lugar onde só se lhe quer mal
E num momento de desafio ao destino
Coloca na menina toda a esperança
Condensada num nome de Portugal!

22 junho 2017

Decisão

Está concebida para breve a partida.
Em longa viagem se aventuram pai e filha,
É preciso fugir desta família e sua armadilha...
Foi Lisboa a escolhida para uma nova vida.

21 junho 2017

Estrume sagrado

Harshal olha em redor e só vê sujidade.

Tudo lhe passou a cheirar mal
Entranhou-se-lhe no olfacto
A crueldade da família
Os edifícios de reabilitação
Um dia tentados
Agora destroçados
As barracas de sempre
Cinicamente de pé.

Pisa um estrume
E pragueja a desgraçada desta vida
Que sempre o sufocou...

20 junho 2017

Tentativa de assassinato

Um choro assustado repõe a razão
Pede o calor do corpo da mãe
Mas mãos frias a seguram sem amor,
Menina nascida na inconveniência,
Um trágico golpe se tece ao seu coração!
Criatura orfã, desgraçada, sem valor!

19 junho 2017

Harshal e a esposa morta

E de repente, o silêncio!
Depois, a cama morta ergueu a sua voz grave
Ecoou pela mente confusa
Ondulando lentamente...
E de repente, o corpo inerte tomou o espaço
E abraçou o medo,
Num instante suspenso.

17 junho 2017

O primeiro olhar

Harshal sai em força,
Vai disparado,
Atravessa conversas,
Afasta cadeiras,
Gritos, desavenças,
Abre as portas,
Salta por sobre desgostos
E lamúrias,
Por sobre todas as barreiras!
Tudo em redor se apaga!
Leva nas mãos a sua alma inteira
Com o sentido do mundo deposto
No pequeno e lindo rosto
De olhar negro, vivo, encantado!,
Que tão fundo o esmaga!
Sua filha, assim o tocou
Mal a viu e logo se transformou
Num ser maior e amado!

16 junho 2017

Menina!

Levam-se mãos à cabeça,
Há gritos, grande discussão começa!
Que desgraça se nos abateu!
Este bebé que hoje nasceu
Traz um desgosto, nasceu mulher!
Será nossa ruína, ninguém a quer!

Nesta família, o chão tremeu!

15 junho 2017

14 junho 2017

Sortes

Menino ou menina?
A fortuna ou o abismo?
Na hora do nascer,
Será um sol brilhante
Ou terrível o sismo!

13 junho 2017

Harshal vai ser pai

Salta-se-lhe no peito de alegria em alegria
Como quem salta de poça em poça,
Uma água castanha premiada com um arco-íris
E a miséria encolhe enquanto o coração aumenta.
Jamais com tão grande felicidade sonharia:
Um casamento a bem-querer sua linda moça
E uma família a crescer, que mais há a pedir?
Os maus agoiros e as nuvens escuras afugenta!

12 junho 2017

Gravidez de Gora

Nuns imensos olhos negros
Brilham alegremente as lágrimas
Da maternidade sentida
Num doce e redondo ventre
A vida a gerar a vida
E a trazer uma mulher contente!

11 junho 2017

A recompensa

A vida abriu o seu sorriso
Grande quanto o prazer
Descoberto e intenso
Tanto quanto o tempo adiado
Noite após noite insaciado
Ainda, guloso, exigente!
A lua luminosa a atentar,
Pela janela dentro, nos dois corpos
E sua luta, repetida até o sol acordar!

09 junho 2017

Antecipação

Dharavi nunca pareceu tão belo
A Harshal que vai cantarolando
Pelas labirínticas ruelas lamacentas
Onde o Sol lança reflexos coloridos
E se escutam as crianças a brincar.
Vestiu o seu melhor kurta pajama
Combinado com o mais largo sorriso...
Gora fez-se mulher e que linda!
Hoje é o longamente esperado dia
Em que o casamento se irá consumar.

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Relembrando:
http://balcaodopoema.blogspot.pt/2017/04/a-longa-espera-de-harshal.html

08 junho 2017

O passado presente na memória

Os noivos chegam ao novo lar
E toda a Vila fica a vibrar,
Quer, por força, o casal conhecer...
À porta lhe irão bater.
Um dia: 'vizinhos, bem-vindos'
Outro: 'Tudo o que precisar'
Ou: 'Estamos naquele andar'...
Mas um olhar especial
Tem o nome de Harshal:
Ao seu solitário coração
Foram bater!
Ah! Quanta recordação!
Sente a Índia regressar...

07 junho 2017

Harshal vê Bia

Quem vem lá?
Há novidade na Vila!
Ah! Que linda rapariga!
Tão redondinha barriga
Seguindo o seu senhor!
Harshal sente o entusiasmo
Provocar-lhe um espasmo,
Olhos de sorriso em flor!
Loja aberta, pronto a servi-la,
Como se chamará?

06 junho 2017

Vila Pinto, novo lar

Passam uns gatos numa miada conversa.
A alvura dos prédios a desenhar um pátio
Onde a vida empurra a muita pressa
Por sobre as pedras redondas da calçada.
Cheiros novos atravessam os ares,
Vozes dispersas, motores, muitos andares...
Abre-se um sorriso de criança animada
A quem se fez afortunada promessa!

05 junho 2017

Boa tarde, Lisboa!

Chegam à nova vida às quatro da tarde.

Bia olha o ponteiro do relógio no pulso fino
E ressente-se dos pés inchados da caminhada.
Em redor a Vila Pinto, sua nova morada,
Regista este momento num múltiplo olhar:
Em cada janela curiosa se recebe este destino.
Sobe a escadas, linda, que estás quase a descansar!

De um beiral se solta o voo de uma ave.

04 junho 2017

Começo de vida?

Um novo dia amanheceu,
Alegre, chilreante, dourado.
E muitos são os beijos e os abraços
E as felicidades na hora do adeus.
Da grande cidade acena o futuro,
Essa amálgama de tudo e de nada.

Parte-se para longe do presente.

03 junho 2017

Arrefecimento

Bia chora esta noite por amar
Na solidão da gravidez que a desfeia
O mistério há tempos que se perdeu
E hoje o lençol não aqueceu
Agora que se entregou a casar!

02 junho 2017

As núpcias

Foi festa de arromba o casório,
Alta madrugada, barris esvaziados...
Mas, ao prestar provas, foi o noivo inglório!



01 junho 2017

O casamento de Bia e António

Juntou-se o povo à festa
Do herói do Ultramar
Que veio à terra casar.
Na sua melhor farpela
A aldeia pôs-se bela,
Lançou foguetes
E mandou a banda tocar.
Terá sido feito peditório
E hoje é grande, é farta
A mesa que se oferece,
Toda a aldeia convidada
Ao memorável casório.